A balança entre as estratégias dos 4% de retirada
Há quase duas semanas estamos investigando taxas de retirada que fazem sentido. Vimos que a taxa padrão dos 4% é questionável e que, aqui no Brasil, o cálculo é ainda mais complexo.
Nesta investigação, analisando regras de meta de gastos, descobrimos uma dicotomia entre duas estratégias de retirada: a conhecida regra dos 4%, em que você retira um valor fixo no início (4% do patrimônio) e depois ajusta esse valor de acordo com a inflação nos próximos anos; e a estratégia em que você retira um percentual fixo do patrimônio, garantindo que ele nunca acabe.
No primeiro caso, teríamos a seguinte dinâmica:
R$1.000.000,00 de patrimônio
4% na primeira retirada = R$40.000,00 para consumo no próximo ano.
A partir daí, as retiradas seriam constantes em R$40.000,00 por ano, ajustadas pela inflação do período. Como você pode perceber, essa estratégia “trava” o consumo até o final da aposentadoria, ajustando-o apenas pela inflação. Ela ignora o desempenho do mercado e continua retirando o valor anualmente do portfólio. O risco aqui está em enfrentar uma grande depressão do mercado, principalmente no início da aposentadoria, deteriorando o portfólio de tal forma que ele não consiga se recuperar para atender às suas necessidades até o final da vida. Ou seja, ele acaba antes do esperado. Essa sequência negativa de retornos em portfólios de aposentadoria é o que chamamos de risco de sequência.
Um exemplo:
Sequência negativa de retornos:
Imagine que seu portoflio teve perdas de 10,1% e 13%, dois anos seguidos. Se você tivesse se aposentado nesse mercado em baixa, retirando R$40.000 por ano, seu saldo cairia para $687.927 no início do terceiro ano. A combinação de perdas e saques no capital teria reduzido significativamente seu patrimônio.
Sequência positiva de retornos:
Agora, suponha que você se aposentou em um mercado em alta. Em dois anos, seu portfolio teve retornos de 19,4% e 12,8%, respectivamente. Mesmo fazendo retiradas, o bom desempenho do mercado faria seu saldo crescer para R$1,24 milhão ao final desse período.
Por outro lado, numa estratégia de retiradas baseadas no valor do patrimônio, utilizando os mesmos 4%, a dinâmica muda:
R$1.000.000,00 de patrimônio
4% na primeira retirada = R$40.000,00 para consumo no próximo ano.
Em uma sequência ruim a de cima, a retirada para o 3 ano ano seria:
R$687.927,00 * 4% = R$27.517,08.
Perceba que, em dois anos, o valor que inicialmente era de R$40.000 de retirada caiu para R$27.517,08. Houve uma queda drástica no consumo, e você precisaria se ajustar a essa realidade. Nesta estratégia, o consumo varia de acordo com o desempenho do mercado e do portfólio. Não há suavização do consumo, e você enfrentará dificuldades em períodos ruins. É claro que, nesse modelo, o portfólio nunca se esgota, mas o custo disso pode ser alto.
Portanto, nessas duas abordagens você fica entre:
Determinar seu consumo, ajustá-lo apenas pela inflação e ignorar o mercado, o que oferece conforto de um consumo fixo, mas coloca seu patrimônio em risco.
Focar em manter o patrimônio, variando o consumo conforme o mercado, o que coloca em risco o seu estilo de vida ao longo da jornada.
Ao considerar retiradas percentuais do portfólio, existe alguma solução que equilibre essa balança? Sim! E já dou o spoiler: definir um consumo-base e adaptar sua retirada de acordo com o desempenho do seu portfólio de aposentadoria, uma mistura das duas estratégias . Falaremos disso nos próximos posts.